Thursday, August 12, 2010

(avô)

Avô, prometeste que me ensinavas a pescar. Suponho que seja mais uma coisa a acrescentar à lista de coisas que não chegaste a cumprir.
Mas eu aprendi a pescar, avô... Aprendi a pescar estrelas.

A perder-me horas infinitas no céu, a desenhar-lhe as formas. A amar-lhe os tons.

Gostava que me tivesses visto, avô, quando sorria para ti. Já depois de todas as máscaras e películas de pele retiradas. Éramos, fomos, cúmplices, avô, e eu nunca to disse. Nunca to disse...
E agora, que já é tão tarde, tão dolorosamente tarde... Pesco estrelas com o olhar, todas as noites, só para ti. Apanho-as cuidadosamente, de dedos trémulos e queimados junto ao coração, dou-lhes um beijo ao de leve e guardo-as dentro do bolso.

Elas estão cheias de pó e de teias de aranha porque a maior parte de nós já se esqueceu de como sonhar. De se perder por entre os farrapos de nuvens e de apanhar asas de pássaros cadentes.

Segredo-lhes então, «um livro, avô. só para ti.» Mas será mais um livro que nunca irás ler.

É o que te prometo, avô, somente isto, fraca promessa é, tão terrivelmente mendiga, tão carregada de culpa e de saudade, tão coberta de insónia. escrita de mãos dadas com as estrelas e o céu.